As abelhas têm um papel fundamental na produção de alimentos comuns no nosso cardápio, como grãos, frutas, legumes e até mesmo carne e leite, uma vez que as criações animais que fornecem estes mantimentos se alimentam basicamente de plantas forrageiras. Elas se encarregam da polinização e 35% de nosso suprimento alimentar dependem desses agentes”. Cerca de 300 mil espécies de plantas precisam de polinização animal para se reproduzir o que representa 90% de todas as plantas com flores. Na agricultura não é diferente, 75% de toda a produção agrícola depende de polinizadores”, afirma o Dr. Cristiano Menezes, pesquisador da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária).
A polinização é caracterizada pela transferência dos grãos de pólen (gametas masculinos) de uma flor até as estruturas reprodutivas femininas de outra flor da mesma espécie. As abelhas, quando procuram por alimento (néctar e/ou pólen), viabilizam a reprodução cruzada das plantas, graças aos pelos e estruturas de seus corpos nos quais os grais grãos se aderem e são transportados de flor em flor.
Um levantamento (publicado por Tereza Giannini, do ITVDS, em Journal of Economic Entomology) detectou 85 culturas que dependem da polinização para se desenvolver bem, como gabiroba, goiaba, jambo-vermelho, murici, pepino, girassol, guaraná, abacate, pinhão-manso, damasco, cereja, pêssego, ameixa e araticum. Os polinizadores não só aumentam o número de frutos como melhoram seu aspecto, seu tamanho e sua qualidade, pois promovem maior variedade genética. No Brasil, as principais culturas que dependem da polinização são a soja, café, algodão, feijão, laranja, tomate, maracujá, coco e melancia.
O sumiço das abelhas
Estranhamente nos últimos anos, um fenômeno tem acontecido: as abelhas estão desaparecendo. Em 2006, nos Estados Unidos, apicultores começaram a notar que colônias de abelhas estavam desparecendo, ou seja, elas saíam de suas colmeias e não voltavam, também não deixavam rastros. Este fenômeno é conhecido como Desordem do Colapso das Colônias (DDC). Segundo Denise Alves, pesquisadora da ESALQ/USP (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz/Universidade de São Paulo), existem muitos aspectos que contribuem negativamente para a ocorrência deste fenômeno. “O desmatamento que reduz as áreas onde as abelhas obtêm seu alimento e mantêm seus ninhos, as mudanças climáticas que afetam a fenologia das plantas e o ciclo de vida das abelhas, a introdução de novas espécies, a transmissão de doenças entre espécies. Não é um ou outro fator, são vários”, diz.
No Brasil, o valor anual da produção agrícola que depende de polinizadores foi estimado em torno de US$12 bilhões. Para reverter este quadro, a principal estratégia é manter áreas conservadas próximas às áreas de cultivo. Essas áreas servem de estoques naturais de polinizadores, principalmente das espécies nativas que ainda não podem ser manejadas pelo homem. “É muito importante manter um fragmento de mata nativa próximo à área de cultivo. Assim, as abelhas que moram no fragmento visitarão essa área, realizando a polinização da cultura agrícola e, consequentemente, aumentando a quantidade e a qualidade (sabor, forma, redução de deformidades) dos frutos formados. Dessa forma, o produtor que mantiver essas áreas terá o serviço gratuito de polinização e aumento de sua renda. Aliado e esse serviço, o agricultor também terá o serviço de controle de pragas, já que esses fragmentos de mata abrigam os inimigos naturais de pragas agrícolas”, enfatiza Denise.
O MIP e os polinizadores
Estudos apontam que um dos grandes responsáveis pelo incidente do desaparecimento das abelhas é o uso indiscriminado de defensivos agrícolas, em especial os neonicotinoides, que causam não apenas o desaparecimento, como também, a redução da população de insetos polinizadores. De acordo com o Dr. Cristiano Menezes, para que este problema não se agrave no país, são necessárias algumas medidas como uso de agroquímicos seletivos e o controle biológico. “Alguns produtos químicos são compatíveis com polinizadores e não afetam sua sobrevivência. A simples escolha desses produtos, em detrimento de outros incompatíveis, já permitirá manter o controle adequado de pragas e favorecer a presença de polinizadores. A maioria dos produtos biológicos para controle de pragas, por exemplo, são compatíveis com as abelhas e devem ser priorizados”, afirma.
O debate sobre as causas do desaparecimento das abelhas chegou à mídia com grande repercussão e está levando à população informações sobre a importância das abelhas e dos polinizadores para a produtividade da maioria das culturas agrícolas. Dessa forma, se antes a principal preocupação dos agricultores era afastar as pragas, agora a preocupação é como fazer para atrair as abelhas. “Os produtores precisam adotar novos métodos de controle de pragas, compatíveis com a presença das abelhas. Com o uso das abelhas e do controle biológico em campo, os produtores aumentarão sua produtividade, além de gerar um produto mais saudável e não agredir o meio ambiente” reitera Menezes.
Quando produtos incompatíveis forem necessários, é possível utilizá-los previamente ou posteriormente ao período de floração da cultura. E se for necessário aplicar durante a floração, é possível escolher horários de menor visitação de polinizadores. “No caso de agentes polinizadores manejados, como colmeias de abelhas, é possível retirá-los das proximidades durante o período de carência do produto utilizado e reintroduzi-los posteriormente”, explica o pesquisador. Segundo Menezes, a agricultura orgânica pode favorecer a presença dos polinizadores em campo. “Como muitos produtos químicos utilizados para controle de pragas são incompatíveis com os polinizadores, a agricultura orgânica favorecerá o aumento da população dos polinizadores nesse ambiente”, afirma.
Introdução de polinizadores nas culturas
Também é possível introduzir as abelhas em cultivos onde não há a presença natural destes polinizadores. Algumas espécies de abelhas podem ser multiplicadas e transportadas facilmente, como a abelha africanizada (Apis melífera, a abelha mais comum no Brasil, presente em todo território nacional), as abelhas sem ferrão (Meliponini) ou as mamangavas (Bombus spp.). “As colmeias são fechadas durante a noite, quando todas as operárias retornam para a colônia, e conduzidas até a cultura alvo durante o período de floração. Quando as flores dessa cultura acabarem, elas podem ser reconduzidas para outra cultura ou serem usadas para produção de mel”, explica Menezes.
No Brasil isso é feito na região Sul para polinização de maçã e na região Nordeste para polinização de melão, ambas com as abelhas africanizadas. Em outros países também já são utilizadas abelhas mamangavas para polinização de tomate e outras culturas em cultivos protegidos e até algumas abelhas solitárias (do gênero Osmia). As abelhas da espécie Meliponini também podem ser manejadas para polinização agrícola e estão começando a ser comercializadas para essa finalidade no Brasil.
Abelha sem-ferrão polinizando flor do morango.
Foto: Cristiano Menezes (EMBRAPA).
Abelha sem-ferrão polinizando flor do morango.
Foto: Cristiano Menezes (EMBRAPA).
Pesquisas conduzidas com os agentes polinizadores
Atualmente a Embrapa foca suas pesquisas no aprimoramento das técnicas de multiplicação de colônias, estudando a produção de rainhas em laboratório, controle da reprodução dessas rainhas, desenvolvimento de dietas artificiais, melhoramento do processo de incubação de colônias recém-formadas, entre outros avanços. Além disso, há pesquisas realizadas sobre o comportamento de diferentes espécies de abelhas nas culturas alvo e sua eficiência para aumentar a produção daquela cultura. Cada planta possui seus polinizadores mais adequados e eficientes e estudos recentes têm mostrado que não basta uma única espécie de abelha no pomar, ou seja, quanto mais diversificado for a fauna de polinizadores, melhor a produtividade.
Da Pesquisa à Inovação
Desde 2013 a PROMIP tem investido esforços para a produção massal de abelhas da espécie Scaptotrigona depilis (Mandaguari). Essa abelha é nativa do Brasil e não possui ferrão. O objetivo da empresa é comercializar e alugar colmeias para aumentar a polinização nas lavouras. A iniciativa conta com o apoio da Embrapa Amazônia Oriental, através do Dr. Cristiano Menezes, e da Fapesp.
Segundo o Dr. Marcelo Poletti, Diretor Geral da PROMIP, o objetivo maior é colocar ao alcance dos agricultores agentes polinizadores em alguns os quais possam integrar programas de manejo integrado de pragas. “O processo de produção desses insetos inicia-se em condições de laboratório, onde são produzidas as rainhas, em seguida as progenitoras são encaminhadas para condições de semi-campo mantidas na empresa para fundar as colônias, as quais serão posteriormente enviadas ao campo para o serviço de polinização”. Pretendemos lançar essa nova tecnologia em meados de 2018, finaliza Poletti.