MT VIRA CAMPO DE TESTE PARA NOVAS TECNOLOGIAS

Por Bettina Barros | De São Paulo

Estado que lidera a produção de grãos no Brasil, Mato Grosso se tornará também o maior “campo experimental” para tecnologias disruptivas voltadas ao agronegócio. Iniciativa liderada pelas três mais importantes entidades do setor no Estado – Famato (que representa agricultores e pecuaristas), Senar (qualificação rural) e Imea (processamento e análise de dados) – reunirá amanhã, pela primeira vez, produtores e startups para a criação de um ambiente de inovação e empreendedorismo capaz de trazer soluções para velhos e novos problemas.

Batizada como AgriHub, a iniciativa começou a ser desenhada há mais de um ano, na esteira de movimentos similares em polos de conhecimento no país e no exterior, para unir pontas hoje desconectadas – produtor, empresas, pesquisadores, startups e investidores.

“Precisamos ‘mato-grossar’ a tecnologia”, resume Heygler de Paula, que participava do Start-Up Brasil, programa federal para aceleração de startups, e agora comandará o AgriHub. “A solução criada nos EUA não serve às necessidades dos produtores brasileiros. E a solução para a cana do Sudeste também é diferente da adotada no Centro-Oeste”.

Na quinta-feira, seis produtores de médio porte de Mato Grosso serão apresentados a seis startups recomendadas por fundos de investimentos e aceleradoras. Focadas em tecnologias de precisão do plantio, que indicam desde o momento da irrigação até alertas de doenças, cinco das statups envolvidas nasceram em São Paulo – Inceres, Agronow, Agvali, Promip e Agrosmart. A sexta, Bart.Digital, é de Cuiabá, em um indício de que o ambiente de inovação já conquista novas fronteiras.

A intenção é formar uma rede de produtores que aceitem servir de plataforma de teste para as soluções apresentadas por pelo menos um ciclo do produto. Será a chande de a tecnologia vingar. Para tanto, a Famato mapeou nos últimos meses potenciais produtores rurais para iniciar os trabalhos. Levou em consideração os que já têm forte relação com pesquisa e filiação a condomínios e cooperativas, além de apetite ao risco. “É aquele que diz: se resolver meu problema, eu deixo testar no meu barracão”, diz De Paula.

A conclusão de que o AgriHub faria sentido também foi checada com quase 300 pessoas, entre associados da Famato e empreendedores. Segundo Rui Prado, presidente do Sistema Famato/Senar, o que se constatou foi o interesse em soluções para problemas reais e locais. “As tecnologias empregadas hoje no campo não vieram para atender às necessidades do produtor rural. Vieram para atender alguns. Elas não chegam no pequeno e médio produtor”, diz Prado. “De certa forma, o que as startups fazem é democratizar a inovação”.

Levantamento da entidade mostrou que 42% de seus 350 associados dizem já utilizar agricultura de precisão em suas propriedades. Mas a lupa aproximada mostra que há muito potencial: quando dizem “agricultura de precisão”, normalmente ainda se referem apenas ao mapa de fertilidade da lavoura.

A tecnologia pode ajudar desde a guiar tratores por GPS, diminuindo as chances de erros humanos, até análises de dados que aperfeiçoam decisões de plantio. E pode contribuir para melhorar processos operacionais das fazendas, tornando a agricultura mais competitiva.

Ao melhorar processos, a tecnologia ajuda também a elevar a produtividade da mão de obra rural, um problema ainda desafiador no Brasil. Dados do Banco Mundial apontavam que cada trabalhador brasileiro rendia US$ 10 mil por ano em 2014.”Só se fala em produtividade da lavoura, mas o ‘gap’ da produtividade de mão de obra é muito maior”, diz Otávio Celidônio, superintendente do Senar. “Na Argentina, esse rendimento é 130% superior. Em outros lugares do mundo chega a ser 800% maior”.

A adequação de soluções tecnológicas para problemas “mundanos” são as principais inquietações. Prado resumo esse cenário com dois exemplos. “Como produtor, eu não gostaria de mexer na chuva, mas gostaria de prever a chuva. Uma hora antes de ela cair. Ou saber quando a nuvem vai passar”, afirma. “O roubo de defensivos é um grande problema hoje no campo. Já botamos cachorro, ganso. Como a gente consegue resolver isso? Dá para por chip no produto? Será que as startups não conseguem nos ajudar?”.

Futuros encontros entre produtores e empreendedores digitais poderão olhar essas e outras demandas. Os testes, de uma ou mais tecnologias, serão apenas o começo de um novo cenário no campo que começa a ganhar cores vivas.

Fonte: Valor Econômico

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